*Foto: O que restou da Biblioteca Nacional de Sarajevo após os conflitos étnicos nos Balcãs..Aquela noite não consegui dormir. Rolava na cama de um lado para o outro e minha cabeça não parava de pensar... de pensar em 1 zilhão de coisas ao mesmo tempo e mesmo assim pensar em nada... no vazio. Finalmente, lá pelas tantas da madrugada, acabei dormindo e sonhei que estava em Sarajevo. Sim, ainda na época dos conflitos sanguinários que culminaram com a extinção da antiga Iugoslávia.
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Era como se eu estivesse esperando por um ônibus, num local de fronteira religiosa como tinham tantas naquela região... Algumas outras pessoas estavam por ali também, à espera.
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Ninguém falava nada, o silêncio era aterrorizante, uma leve brisa silenciosa tocava em meu rosto e uma nervosa apreensão pairava no ar. Todos estavam com expressões tensas em seus rostos. Tristes, eu diria. Era como se a pessoa ao seu lado pudesse ser um inimigo mortal e mesmo assim todos apavorados e letárgicos.
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Acordei assustado... e voltei a dormir novamente. O sonho continuava. Encontrava-me agora em uma casa sombria, como um mosteiro. Tudo estava em silêncio, quando de repente, uma sirene dispara e poucos segundos depois, começam a explodir bombas em toda parte. Estávamos sendo bombardeados. Havia padres na casa, que surgiam não sei de onde, e que corriam para se proteger. Vestiam batinas pretas, botinas velhas e surradas, eram jovens e bonitos...
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Tentei correr para me abrigar também, mas sentia-me paralisado. Era como se estivesse ali, no meio daquela confusão apenas como observador. Apesar do pavor e da destruição a minha volta, era como se existisse uma certeza, intrínseca, de que eu não iria me ferir.
Mas o medo era real, ele existia em mim, naquele momento de pânico. De repente, apenas há poucos metros de onde eu estava, uma bomba explode, bem ao lado de um jovem padre que tentava se proteger. Voam pedaços do corpo do jovem padre e da casa para todos os lados e um enorme buraco abre-se no teto. Sinto meu corpo sendo atingido por fragmentos de tijolos, carne humana e sangue...
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Olho para cima e vejo um céu estrelado como talvez nunca tivesse visto... Uma linda noite estrelada de inverno... Dava para ver ainda um avião passando alto, com seu rastro, voando suavemente muito alto sobre a casa e... acordo.
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Não conseguia mais dormir.
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3:20 da manhã.
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Visto minhas calças, uma camiseta e meu velho tênis.
Pego carteira, chaves, celular e meu maço de cigarros e saio para caminhar pela Avenida Paulista, pensando...
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Que guerra é essa que estou travando dentro de mim?